Com o grande boom do Instagram, a relação bandas x imprensa deu uma guinada. Com isso, a balança pesou bem mais para os artistas e muitos deles construíram sua base de fãs – também – com conteúdo online, sem depender tanto de outros veículos. Ao mesmo tempo, muitos novos formatos permitem um imediatismo nessa troca.
O PR entra de forma estratégica nessa equação – principalmente no Brasil, onde as funções não são tão bem estabelecidas.
Para explorar um pouco esses novos caminhos e as diferenças de um país com outros, troquei uma ideia com a Thais Pimenta, assessora que já trabalhou com festivais como o No Ar Coquetel Molotov, além de artistas como Thiago Pethit e Mustache & Os Apaches.
Hoje em dia, ela mora em Portugal e facilita a ponte Europa-Brasil – tanto de cá para lá quanto o contrário. Um dos resultados desse trabalho foi o lançamento recente do EP LXSP, da banda portuguesa PAUS no Brasil.
Do it você mesmo
Sobre as cenas, ela explica “as dinâmicas são parecidas, porém diferentes. O Brasil é um país enorme perto dos pequenos países europeus, isso faz com que o do it yourself seja bem mais forte por aí, afinal, por mais que tenham mais cidades para fazer shows, a concorrência também é muito maior. Então, o arregaçar as mangas e fazer acontecer é muito mais característica do músico brasileiro que do músico português, salvo raras exceções”.
Mas faz a ressalva logo: “não que o músico português seja preguiçoso, longe disso. Mas aqui as relações ainda se baseiam muito no papel de funções pré-estabelecidas, como manager, produtor, booker, assessoria de imprensa etc. É bem raro alguém que acumule mais de uma função. Certa vez, conversei com um artista grande aqui que disse que o booker jamais inscreve artistas em editais, feiras de música etc., que isso é função do empresário – figura quase em extinção no Brasil. Achei engraçado, pois a grande maioria dos bookers com os quais já trabalhei e trabalho aí fazem mil e uma coisas além de vender shows”.
Outra grande diferença diz respeito ao planejamento e antecedência. “Dia desses estava pautando um veículo da Inglaterra e a orientação para lançamentos é enviar o material TRÊS meses antes”. Igual aqui, né? “Quando são bem organizados, os planejamentos aqui acontecem com quase 1 ano de antecedência – o que é maravilhoso, pois dá pra se organizar e atingir os objetivos com muito mais segurança”.
“E, pra terminar, a forma como as assessorias de imprensa funcionam em Portugal é um tanto quanto diferente de como eu trabalho, por exemplo. Não posso generalizar, mas conversei com um importante radialista local, além de alguns artistas que me contaram que não é costume da assessoria fazer planejamento! Achei isso surreal, pois, pra mim, meu trabalho sem planejamento não existe. Esse, inclusive, é um desafio que sinto que tenho por lá: apresentar uma dinâmica diferente de trabalho. Não que a dinâmica que eles usem seja ruim, mas é diferente”.
Novos velhos formatos
Falando nisso, voltamos às (novas) funções do PR. Para Thais, o PR “é múltiplo – hoje em dia eu pauto de stories no Instagram a playlists em plataformas de streaming –, temos que conversar com todas as plataformas, mas sinto que os veículos de música também precisam se adaptar a essas novas possibilidades de disseminação de conteúdo”.
“É difícil você ver um site que tenha um Instagram massa, um youtube massa, um perfil no Spotify (ou qualquer outro streaming) massa. Dia desses mesmo estava pesquisando playlists e achei um monte de sites que até começaram a criar algumas playlists e depois nunca mais deram continuidade, aí não tem como mesmo dar certo, né?! É um serviço de formiguinha que é preciso ser feito. Inclusive, acho até o streaming bem mais importante que instagram, por exemplo… Sinto que, num futuro não tão longe, esse boom de selfies e exposição vai dar uma pausa, muito em função da saúde mental das pessoas”.
Enquanto isso não acontece, é preciso prestar atenção no que é tarefa do assessor e no que cabe ao social media. “Eu mesma já tentei acumular as funções e não rola, o trabalho não fica bem feito. O universo das novas mídias se atualiza muito rapidamente, precisa ter foco para trabalhar com isso e acompanhar as métricas, fazer relatórios, montar estratégias, enfim, é uma dedicação bem grande. O mundo ideal é que o artista seja o seu social media, mas nem todes têm tempo, paciência e conhecimento para isso”.
Falando em conhecimento, fica uma dica do que não fazer: “ontem (era um domingo), recebi uma solicitação de uma artista pra fazer o lançamento de single para esta sexta-feira hehehe. É impressionante como ainda tem muita gente que não entende a importância de trabalhar a comunicação com antecedência. Não sei o que se passa na cabeça das pessoas, sério. Será que elas acham que a divulgação de uma música acontece num passe de mágica?! Hahaha só pode. Sempre repito a seguinte frase: milagre eu (ainda) não faço!”.
“Uma coisa maravilhosa que aprendi aqui em Portugal é a forma como eles lidam com o tempo. Nada aqui é pra ontem, isso dá uma paz no coração que você não imagina! Sério! Ninguém responde seu e-mail na hora porque não é obrigado, sabe?! Simples. E whatsapp não é substituto de email, o que é incrível”. – e raro hoje em dia.
“Acho que estão mais que certos, isso obriga a antecedência, educa as pessoas a se organizarem melhor. Tenho pavor de mandar email pra jornalista sugerindo pauta em cima da hora, é muito ruim pra mim, para o jornalista e para o artista que, muitas vezes, acaba sendo o maior prejudicado, pois a pauta não rola. Então, por que não jogar a seu favor e se organizar com antecedência, né?! É tão melhor!”.
Sobre tocar em Portugal
Falando em antecedência, o mesmo vale para quem pretende se arriscar por terras portuguesas com sua banda.
“Tocar aqui não é difícil, mas é preciso fazer um trabalho de PR. Isso, inclusive, foi o que me impulsionou a vir pra cá. Assisti a uma mesa na SIM São Paulo ano passado com importantes nomes da indústria da música em Portugal e esse foi o recado que eles deram. E, claro, não adianta querer vir tocar aqui em cima da hora – os shows são marcados com quatro meses ou, às vezes, até mais, de antecedência”.
Já view?
Durante o papo, comentei um pouco da minha vivência no intercâmbio também. Quando estava em Londres, os esforços de mídia on e, principalmente, offline, pareciam estar focados em artistas menores.
Um exemplo? Na época, Paul McCartney estava lançando seu “Egypt Station”, mas pelas ruas se encontrava bem mais OOH da Anna Calvi, Our Girl e do próprio Oh Sees, que nem inglês é. A Thais também sentiu isso um pouco quando trabalhou com a Sony em Portugal, mas não afirma o mesmo sobre o país com tanta certeza – precisaria avaliar mais alguns exemplos.
A estratégia, no entanto, foi aprovada. “Trabalhar com artista grande, às vezes, é muitooo mais fácil, porque o telefone toca, os pedidos de entrevistas chegam, enfim, você acaba que tem mais que administrar as solicitações do que cavar novas pautas, sabe?! Um artista novo é um desafio, você não sabe como vai ser recebido, depende da boa vontade e do tempo do jornalista pra ouvir, avaliar, enfim, é um processo mais longo e pede mais atenção, com certeza”.